Desabafo (texto sem revisão)...

Cadáver
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Outro dia olhei no espelho e não me vi. Aliás, vi e não vi. Era eu e não era. Eu vi o cadáver que existe em mim. Pode ter sido efeito da luz, cansaço ou algo assim. Mas foi o que eu vi. Vi aquela criatura horrenda, esverdeada, com a pele repuxada por sobre os ossos. Desviei os olhos tão rapidamente que, por um instante, fiquei na dúvida. Mas estou certa que vi.
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Por causa disso, há dias não me olho direito no espelho. Percebi que não sinto falta. A minha falta de vaidade está em alta há muito tempo. Espelhos simplesmente existiam.
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Lembrei de um caso. Na época em que fui para Brasília, colocaram uma foto minha no site do colégio. Um menino da minha sala recortou a foto e colocou o meu rosto no flog dele. Eu não conhecia esse flog e, um dia, parei lá por puro acaso e vi meu rosto na parte de “fotos recentes”. Cliquei e li os comentários. Foi uma sensação muito estranha. Pessoas que eu só conhecia de vista, ou que eu nem conhecia, escreveram xingamentos que eu consideraria fortes até mesmo para serem ditos a um grande desafeto. E eu não tinha feito nada. Contei para um amigo que estava no MSN e ele foi em um dos flogs xingar a autora de um dos comentários. A menina tinha escrito que eu não devia ter espelho em casa, que era (ou sou, sei lá) muito feia e ridícula. Algo assim. Naquele momento, confesso que senti uma certa gratidão pelo meu amigo. Ele percebeu isso e não pensou duas vezes antes de escrever coisas feias no meu blog só porque uma menina havia comentado que discordava de mim em um ponto. A questão é que essa menina era uma grande amiga minha e não merecia esse tipo de coisa. Deletei o comentário dele. Foi o fim de uma amizade marcada por impulsos.
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Como sempre, fugi da razão de ser do texto. Mas não tão sem propósito assim. Essa época, meados do meu Ensino Médio, foi uma das mais felizes da minha vida. E olha que esse caso do parágrafo anterior não foi o único. Vaias, e-mails de corrente com a mesma foto do blog, comentários sussurrados alto o suficiente para eu poder ouvir, falsas brigas vindo na minha direção e me derrubando, enfim, pequenas grandes maldades. Mas isso era só pano de fundo. Como as favelas são só o pano de fundo da realidade de muita gente. Elas sabem que existe, que está ali, mas nem tocam. Eu tinha duas grandes e inseparáveis amigas. Amigas que eu era capaz de defender com a minha própria vida se fosse necessário. Amigas que construíram uma locomotiva comigo (literalmente). Amigas que entendiam muita coisa quando eu dizia “ai”. Amigas que estavam sempre ao meu lado, mesmo sem eu pedir, mesmo que isso significasse gastar uma grana com passagem de avião, mesmo que muitos outros fatores. Amigas que a vida tratou de distanciar de mim, mas que serão minhas amigas eternamente.
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Amigas de uma época em que eu não convivia com o meu próprio cadáver. É tão macabro escrever esse tipo de frase. É tão díspar quando eu penso no que costumo escrever. É estranho. Mas é um desabafo. Um desabafo válido, ao menos por agora. E é válido porque a cada dia que passa eu sinto essa criatura morta com mais força. É como um bolor que cresce. Ou um odor que se espalha.
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Há dias em que eu realmente me sinto um cadáver ambulante. Uma pessoa sem desejos, sem vontades, que não fala, que não faz, que não é. Vivendo em modo automático. E quando o meu eu interior busca companhia e amizade, muitas vezes encontra pessoas que parecem enxergar só o cadáver. Suportam aquela presença por educação. Até respondem o que ela pergunta. Mas não olham para ela. Eu não sei o que fiz para essas pessoas. Acho que nada. Mas compreendo. É algo horrível de se ver. É complicado tolerar essa presença.
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No início do semestre passado eu tentei fazer uma coisa e acabei falhando miseravelmente. Nesse semestre, tive isso imposto a mim. Eu tentei me afastar dos meus amigos porque sabia que, em algum momento eles iriam se afastar de mim. Pensei que se eu mesma fizesse isso, sofreria menos. Como já disse, não consegui. Eu não tentei fazer isso por não confiar na amizade, mas por observar uma certa superficialidade. É difícil para mim acreditar que pode existir um grupo grande de pessoas onde todo mundo é amigo de todo mundo. A mim, parecia que ali ninguém era, verdadeiramente, amigo de ninguém. Com algumas poucas exceções, claro. Ao me afastar eu perceberia se me enquadrava em alguma exceção. Queria que alguém fosse me buscar no meu isolamento e me perguntar o que eu estava fazendo ali. Ninguém foi me buscar e eu voltei de cabeça baixa por não conseguir ficar sozinha. Agora estou sozinha. Estou tremendamente sozinha. Eu não consigo companhia para o teatro nem oferecendo vale-ingresso e me dispondo a assistir qualquer peça que a pessoa queira. Antes eu achava que me bloqueavam no MSN. Agora eu espero os blogs mudarem de endereço para parar de receber os comentários que eu insisto em escrever para tentar me reaproximar. E me odeio por parecer um maldito cachorrinho que recebe paulada e depois vai correndo receber um carinho de um dono que nem presta atenção nele.
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Eu achava que essa seria a fase mais feliz da minha vida. Sem aulas de educação física, sem beneficiados por pertencerem a famílias tradicionais, sem pessoas que julgam antes de saber do que se trata. Descobri o meu engano do pior jeito. A cada dia recebo novas lições de como “poderosos” fazem as coisas acontecerem e como os futuros jornalistas devem saber usar isso em seu favor. As pessoas falam isso como se fosse normal e perfeitamente correto. E eu tenho nojo disso. A cada dia percebo que a opinião defendida por um maior número de pessoas influentes (ou populares em certos círculos) é a que vale. Os outros que se conformem em estar errados. Com todo respeito a sua opinião, claro, mas cale a boca mesmo assim. E eu ouço, tento argumentar (ou não) e termino meus dias esperando o término dos meus dias. A qualquer segundo tropeçarei na minha cova.

6 comentários:

  1. Rê, eu disse que iria ao teatro com vc, mas não imediatamente depois da aula, pois precisava entrevistar o Edson Bueno para a matéria do Jorlab. Então, não diga que ninguém quis ir com você.
    Sobre o restante do seu texto (principalmente a parte que diz respeito aos acontecimentos na floresta), a gente conversa pessoalmente. Acho que é hora para isso.
    Se cuide!
    Beijo!

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  2. Ih, vai ser dificil comentar nesse post...
    Talvez você não enxergue o que está fazendo, Rê. Eu até acredito nisso porque eu raramente enxergo os meus erros. Realmente, talvez você esteja a cada dia mais sozinha, cada dia mais "cadáver", como vc disse, mas, se isso está acontecendo, são frutos que você plantou, Rê. É aquele velho ditado de tia: a gente colhe o que planta, ou, quem planta vento, colhe tempestade.
    Todas as pessoas são diferentes e têm comportamentos diferentes, normal. Com algumas pessoas nós somos compatíveis, com outras não. Eu encontrei amizades na faculdade que são mais do que amizades, são encontros cármicos, irmandade, mais do que isso até. Com as trinta pessoas? Não, com um décimo disso, mas vale a pena cada segundo passado com esse décimo.
    Se você está sozinha, é porque não controlou o seu temperamento e magoou várias pessoas. Você pode ter sido magoada, mas não é magoando que a gente se defende. Não é dando piti que a gente consegue amigos, rê. Pense nisso.

    No mais, concordo com a Carla. Conversamos pessoalmente. Talvez seja a hora mesmo.

    [obs: me abstenho de opiniões sobre o teatro, mas a história que a Carlinha me disse foi diferente da postada aqui.]

    Beijo!

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  3. Ah Rê, eu já te disse que você devia dar as costas pro passado e viver o que há pra ser vivido, com lados bons e ruins, mas antes de tudo, concretos. Aquele tempo já passou, não vai se repetir entre nós, embora não sejamos os melhores amigos uns dos outros, gostamos de todos e convivemos com isso. Como a Camila disse, não dá pra ser o melhor amigo de 30 pessoas, você precisa escolher (não é bem esse o termo, mas você entende) de quem você vai gostar, ou mesmo amar, e respeitar o resto, embora não sinta muita coisa por eles. É assim e sempre será.
    Agora, eu respeito você pelo o que você passou, mas saiba que eu não acho que estejam te deixando pra trás. As pessoas simplesmente têm outras coisas pra fazer, nem sempre os interesses são os mesmos.
    Agora, chega de tristeza, vamos nos divertir muito assistindo a toda a sua coleção de filmes!
    E olha, você tem uma amiga que vai dormir na sua casa!Como nos velhos tempos! hehe
    Beijos e esquece isso!

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  4. Quando li este texto, se passaram muitas coisas em minha mente. Fiquei um tanto surpreso, um pouco aéreo, mas entendi a mensagem do texto. Engraçado, está ocorrendo uma situação similar comigo (tanto que, um dos posts do blog, foi sobre tal caso). Possa ser que eu não passe algo de grande ajuda, ou que não seja a melhor pessoa para dizer alguma coisa, mas irei dar o meu ponto de vista.

    Bem, de começo, a primeira coisa que lembrei foi de situações que ocorreram também na minha época de ginásio. Muito desgradáveis, por sinal. E no mesmo patamar, a beleza. Uma coisa que eu lembrei foi que, não somos os únicos a sofrer com insultos, xingamentos, racismo ou qualquer coisa parecida. Nunca conseguimos agradar a todos, e infelizmente, vamos conviver com isso em muitas situações da nossa vida.

    Aprendi também que, acima de tudo, não são as pessoas que irão nos amar, mais que nós mesmos. O primeiro amor é sempre o nosso, e temos que tê-lo, para não sofrer. Sendo pessimista, intitulando-se "cadáver", só faz com que as pessoas que realmente te amam, sofram. Fiquei triste ao ver que, neblinas do seu passado ainda te incomodam, e que você sente vergonha de si por elas ainda te abalarem. Viva cada dia unicamente, e deixe as coisas do passado, no seu melhor lugar. Você é maravilhosa do jeito que é, e tenho um orgulho enorme do caráter que você tem.

    Houve um parágrafo que eu me vi completamente. Tenho a vontade de fazer a mesma coisa, porém, aprendi a conviver com a solidão, e deixar com que as coisas andem pelo seu próprio fluxo. Infelizmente, não dá para forçar as pessoas gostarem de nós. Temos que conquistá-las pacientemente. Claro, sofremos com isso, e sempre culpamos os outros, e neste caso, sempre esperamos. Algo cujo qual não devemos (aprendi isso da pior forma). Sei como é ter a vontade de sair ou marcar algo com alguém, e sempre este alguém/grupo tem algo a ser feito (postei isso no blog também). Quando tal vontade bate, lembro de um conselho seu: ocupe sua mente.

    Infelizmente, o mundo é muito sistemático. Há muitas coisas que nós não vamos concordar e, temos que continuar a sermos diferentes, mesmo que seja altamente complicado resistir. Nos confrontamos com isso todos os dias, nas mínimas e nas grandes situações. Considere nestas horas as suas crenças como raízes e cuide delas sempre.

    Agora enquanto a respeito da cova, realmente, você não deveria pensar em coisas assim, e não suportaria perder alguém que amo. Eu perderia a minha principal incentivadora, e preciso muito de você (você sabe do quê). Seja apenas você mesma, e com o tempo você irá ver o quão a sua pessoa é especial para os poucos que gostam de você. Apenas viva cada dia de cada vez, não esperando, e sim, plantando coisas boas. Separando pensamentos negativos e esquecendo dos antigos casos.

    "...Corte as palavras pessimistas do seu pensamento e tudo será melhor!!!

    Tudo ficará AINDA melhor!!!"
    ...Lembra?

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  5. Rê, que texto pesado... Fico triste de saber que você está passando pelas situações descritas e que se sente tão mal desse jeito. Não tinha me dado conta da gravidade do problema. Sei que talvez não correspondemos a tudo que você espera, e entendo que isso te entristece. Mas o que posso dizer? Essas coisas acontecem com todo mundo. Tenho certeza de que ninguém está agindo com maldade com você. Sei que você já sofreu muito, mas o nosso círculo de amizades pode ser bastante heterogeneo, mas é muito sincero. Eu pelo menos sinto isso. Qualquer coisa, fale comigo se quiser conversar.
    Um beijo.

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  6. E complicado, complicado expor a propria vida de maneira tao pessoal e direta, para pessoas que se conhece...
    Porque as vezes sao apenas desabafos para conosco... e as vezes injustos, as vezes crueis, mas passageiros, que so nos interessam naquele momento... Quando pessoas que voce realmente se importa leem e te veem num momento tao delicado, ha sempre tanto medo, tanto machucado.... mas, eu ainda, ainda acredito, que as vezes falar seja necessario.
    Uma vez eu me olhei no espelho e vi algo tao diferente e doentio; minha pele era amarela, minhas olheiras iam ate a boca, eu ja nao tinha cabelos fortes; a dor foi indescritivel...e tenho certeza que entendo o que voce viu.
    E dificil, e dificil a solidao, o estar sozinha, em uma situacao em que voce precisa tanto de si completa, quando voce queria mais que tudo viver completamente...
    e dificil...
    Mas vejo tantos amigos querendo conversar com voce...
    e tenho certeza que as coisas melhorarao, melhorarao sim...'
    -//

    E, sobre teu comentario no meu blog, ela se chama Anne-Amelie tambem por isso. O que me aconteceu foi uma sucessao das duas, nessa ordem.
    Sobre o link, claro, claro. Apenas me avise qual link voce prefere que eu link no meu, pode ser?

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